Uma das mais belas obras de Fernando Pessoa: Poema em Linha Reta!



Uma das mais belas obras de Fernando Pessoa: Poema em Linha Reta!

O que dizer para complementar um texto que fala por si só!? Numa de minhas pesquisas descobri essa obra-prima escrita por Fernando Pessoa, sob o heterônimo de Álvaro de Campos, que apesar de redigida no início do século passado, parece feita nos dias atuais.

Com a febre das redes sociais, nunca estivemos tão próximos de pessoas "perfeitas e felizes", que fazem  questão de mostrar os seus personagens, deixando de lado o ser comum, dotado de defeitos e qualidades; a nova geração é composta de verdadeiros super heróis egocêntricos, focados em seu próprio umbigo e em suas convicções...
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Ah, todos estão certos e são poucos os que param para observar determinado assunto como um todo, de forma imparcial, abertos a observar as falhas de suas crenças eideologias... Se colocar no lugar do outro, pra quê? Perceber que cometemos erros, pra quê?
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São tantos "porquês e senões" a serem ditos sobre o poema, além de sua proximidade aos nossos dias... Tanta coisa a ser comentada, mas, diante de tamanho egocentrismo e incompreensão sobre os temas, prefiro me ater à beleza das palavras e à sinceridade do autor em se mostrar tão descontente e decepcionado com a farsa e hipocrisia do ser humano.

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Que ele sirva de reflexão a todos nós sobre os riscos de nos prendermos em nosso egocentrismo e de nos perdermos dentro de nós mesmos.

Jansen Sarmento


 Poema em Linha Reta
Nunca conheci quem tivesse levado porrada.Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,Indesculpavelmente sujo,Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,Que tenho sofrido enxovalhos e calado,Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachadoPara fora da possibilidade do soco;Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.Toda a gente que eu conheço e que fala comigoNunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...Quem me dera ouvir de alguém a voz humanaQue confessasse não um pecado, mas uma infâmia;Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?Ó príncipes, meus irmãos,Arre, estou farto de semideuses!Onde é que há gente no mundo?Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?Poderão as mulheres não os terem amado,Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?Eu, que venho sido vil, literalmente vil,Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.
(Álvaro de Campos / Fernando Pessoa)

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